Era uma manhã ensolarada em Petrolina (PE). Com papel, caneta, gravador e câmara fotogáfica em mãos, chegamos ao nosso destino às 11h. Sentamos e esperamos por alguns minutos. Vestida com as indumentárias essenciais para a sua profissão, meias, sapatilhas nos pés e um colan, a mulher, de estatura baixa e sorriso aberto, nos recebeu com muita simpatia e começamos um descontraído bate-papo.
Vildete Matins Cezar Cabral nasceu na cidade de Cruz Alta (RS) e se apaixonou pela arte desde a sua infância. Cresceu rodeada por entre as telas de seu pai e a música que embalava os passos de dança da mãe e da irmã, Valdete. Conterrânea do escritor Érico Veríssimo, a menina curiosa logo despertou o interesse pela dança aos oito anos de idade quando passou a assistir às aulas da irmã, e aos 13 já dava aulas de ballet sem pretensão de se tornar profissional. Aos 15 anos, realizou seu primeiro solo e coordenou o primeiro festival de dança.
O tempo passou e a menina decidiu levar a dança como profissão. A princípio, o sonho de ser bailarina começou ao cursar Belas Artes na Faculdade Federal de Santa Maria, aos 16 anos, em 1973. No entanto, precisou se transferir para a Universidade de Brasília quando seu pai, militar, foi transferido com toda a família para Petrolina, e na região não existia o curso. Morando na capital do país, a jovem esbanjava talento e conseguia elogios de seus mestres.
A partir daí nunca mais parou. Começou a dar aula de ballet para filhos de diplomatas, participou de cursos no Rio de Janeiro e concentrou os seus estudos no que mais gostava: o ballet clássico. Sonhava ganhar uma bolsa para estudar no exterior. Porém, por motivos profissionais, optou por voltar à sua cidade natal para concluir o curso que, até então, não havia terminado. Foi aí que, no último período de faculdade, por intervenção divina ou um incidente da vida, no final do ano de 1978, um telefonema mudou a direção de seus planos. Sua irmã fora assassinada com cinco tiros pelo marido, o que a fez arrumar as malas e partir para Petrolina.
Com o intuito de ajudar a mãe que estava inconformada e depressiva com a morte da filha, a futura bailarina chegou à região do Vale do São Francisco com a intenção de pôr em prática um sonho da irmã, abrir uma escola de ballet e compartilhar o talento possuído por ambas. Anos depois, por motivos pessoais, a família decidiu voltar para o Rio Grande do Sul, porém Vildete decidiu ficar. E assim aconteceu.
Em 1980, obedecendo à condição de seu pai - fazer um curso superior - para ficar em terra sãofranciscana, Vildete se formou em administração pela Faculdade de Ciências Aplicadas de Petrolina (FACAPE), já que não havia curso de Artes. Mas o sonho de investir na arte do ballet continuava. Assim, dois anos depois, nomeou a escola fundada pela irmã de Escola de Ballet Valdete de Cezar, uma forma de homenagear a irmã.
Entre uma onomatopeia e outra para contar todos esses anos de experiência, aprendizado e viagens por diversos países e estados no Brasil, Vildete possui uma bagagem extensa de prática e conhecimento, e se orgulha de já ter sido a única representante nordestina de sua modalidade no exterior. Além de trabalhar com crianças carentes e autistas, “o que proporcionou uma vida melhor para essas pessoas”, conta.
Hoje, aos 54 anos, casada e com uma filha, uma das pioneiras da dança no Vale do São Francisco se considera uma pessoa feliz e realizada profissionalmente. Entretanto, gostaria que a sua escolha por ensinar fosse mais valorizada e explorada tanto na região quanto no país. “Apesar de amar o que faço, às vezes fico desestimulada com a nossa realidade e tenho que trabalhar com as frustrações. O brasileiro ainda não consegue entender os benefícios que o ballet traz e acaba deixando-o de lado. Mas, acredito que isso ainda possa mudar”, desabafa.
Acreditando na educação através da arte, fez pós-graduação em psicopedagogia como forma de ajudar suas alunas. "A dança mexe com a sensibilidade das pessoas e muitos a tem como refúgio", comenta. Apesar de não ter conquistado o sonho de se graduar como bailarina pela universidade, quando indagada sobre o que seria de sua vida se não existisse a dança, Vildete é sucinta. “Se não tivesse a dança, eu não teria conseguido chegar até aqui. A minha vida seria simplesmente vazia. Eu não seria nada”.
Catharine Matos (texto e foto)Graduanda do 6º período de Jornalismo em Multimeios da UNEB
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